“A ditadura impede que o povo tenha voz”, gritam curitibanos em protesto contra golpe de 1964

Redação com Banda B

“A ditadura impede que o povo tenha voz”, gritam curitibanos em protesto contra golpe de 1964

O grupo deve protestar durante toda a tarde domingo. Há cerca de mil pessoas no encontro

Nasci em 1952 e vivi todo o período. A ditadura impede que o povo tenha voz”. Foi assim que a professora Lígia Folda, de 67 anos, resumiu o período da ditadura militar, que começou em 1964 e durou 20 anos. Neste domingo (31), nos 55 anos do golpe militar, ela estava entre os cerca de mil curitibanos que protestaram, na região central, contra a decisão do presidente da república, Jair Bolsonaro, de que os quartéis comemorem a data.

Morava em Laranjeiras do Sul e foi muito difícil. Pessoas lá foram presas e sofreram tortura em Guarapuava. Foi um retrocesso enorme, a ditadura impede que o povo tenha voz. Apenas os poderosos têm voz. Eu não consigo entender como tem gente que apoia isso”, reclamou a professora em entrevista à Banda B.

Muitos jovens que não viveram a ditadura, mas estudaram sobre ela, participaram do protesto na Praça do Homem Nú. “Pessoas acreditam que não houve ditadura em Curitiba, mas houve muita coisa sim. A ideia é trazer à tona que aconteceu muita morte e tristeza neste período. Quando você estuda, você percebe realmente o que foi a ditadura militar”, disse o estudante Orue Brasileiro.

Já a estudante Ana Spreizner afirmou que o movimento é de resistência. “Hoje vamos lembrar locais que aconteceram prisões políticas e até torturas. Vamos falar sobre isso, debater o tema. Quem hoje apoia, é porque não conhece a história”, limitou-se a dizer.

O grupo deve protestar durante toda a tarde domingo. Há cerca de mil pessoas no encontro.

Redação com  Agência Brasil

Manifestantes a favor e contra às comemorações alusivas ao 31 de março de 1964, quando foi instituído o governo militar no Brasil, saíram às ruas hoje (31) em várias cidades, incluindo Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo. À noite, na Esplanada dos Ministérios, um grupo favorável às celebrações deve exibir 30 vídeos em um telão de 24 metros quadrados, mostrando a atuação das Forças Armadas de 1964 a 1985.

As manifestações foram convocadas após o presidente Jair Bolsonaro orientar a leitura de uma ordem do dia nas unidades militares em alusão à data. Segundo militares, a ordem do dia foi lida na sexta-feira (29), sem alterações de rotina.

Ontem (30) a Justiça Federal liberou as comemorações pela tomada de poder pelos militares e a deposição do ex-presidente João Goulart, há 55 anos.

Brasília

O jornalista Felipe Porto, 58 anos, organizador do evento e ligado à União dos Movimentos de Brasília, chama o ato de apoio à “intervenção cívico-militar”. “Não é para comemorar excessos, que aconteceram nos dois lados”, disse se referindo ao que nomeia como “guerra” entre as forças do governo durante o regime militar (1964 e 1985) e movimentos guerrilheiros nas cidades e na zona rural que “poderiam levar o país ao comunismo e à ditadura do proletariado”.

A recepcionista de salão de beleza Rúbia Cristiana de Oliveira, 49 anos, que se considera “ativista das ruas há cinco anos”, chegou antes dos preparativos da exibição dos vídeos e elogiou a participação dos militares na política nacional desde a intentona comunista ao governo do presidente Jair Bolsonaro.

“É preciso muita perspicácia, paciência, cautela, sabedoria para nos unir nesse momento. Não interessa quem ergue o quê, sé é uma bandeira impeachminsta (sic), intervencionista ou petista. Interessa é tirar o povo da extrema pobreza, valorizar as nossas empresas, o nosso país, o que produzimos”.

O estudante Luiz Felipe Carmona, 16 anos, participou de uma manifestação contra as comemorações do 31 de março, no Eixo Rodoviário Norte, no Plano Piloto. “A gente debate bastante”, conta ao relatar o ambiente em sua escola, e lamentar que “também tem gente que não se importa”. De acordo com ele, a importância de estar na manifestação é “conhecer o passado”.

Fernanda Santana de Oliveira, doutorando em Desenvolvimento Sustentável na Universidade de Brasília também esteve no Eixão Norte e afirmou que o “31 de março é uma data de pesar e de reflexão para evitar que isso aconteça novamente na nossa história”.

Rio de Janeiro

No Rio de Janeiro, os manifestantes se concentraram a partir das 16h na Cinelândia, no centro. Com cartazes críticos, os manifestantes exibiram fotografias de vítimas do regime militar e relatos de episódios que aconteceram no período. O começo do ato foi marcado por músicas como Pra não dizer que não falei das flores, de Geraldo Vandré, CáliceApesar de você e Vai passar, de Chico Buarque.

No carro, de som, políticos, entidades estudantis e outras lideranças populares falaram sobre o período da história do Brasil, lembrando de atos como o incêndio da sede da União Nacional dos Estudantes (UNE), na Praia do Flamengo, ocorrido no dia 1º de abril de 1964.

Filho do cartunista Henfil, o cronista Ivan Cosenza de Souza disse que há uma tentativa de reescrever a história do Brasil. “É incrível que pessoas tentem passar panos quentes nessa página horrível da história do Brasil.”

A funcionária pública Anabela Rocha disse que o ato foi espontâneo: “Eu acho importante deixar claro que a gente não quer que nunca mais aconteça algo parecido”. “A gente repudia totalmente que haja qualquer tipo de comemoração.”

Manifestantes fazem ato contra o regime militar de 1964, na Cinelândia, no centro do Rio de Janeiro.
Manifestantes fazem ato contra o regime militar de 1964, na Cinelândia, no centro do Rio de Janeiro. – Tomaz Silva/Agência Brasil
São Paulo

Em São Paulo, o Ministério Público Federal e outras entidades organizaram uma caminhada silenciosa no Parque Ibiraquera, zona sul, em homenagem às vítimas e o reconhecimento de atos de violências registrados durante o regime militar (1964-1985).

O ato começou às 16h na Praça da Paz, dentro do Ibirapuera, com apresentações musicais de Vicente Barreto, Eduardo Gudin e Fabiana Cozza. Os participantes, em sua maioria vestidos de preto, depositaram rosas vermelhas e retratos de desaparecidos políticos.

A procuradora-geral da República e presidente da comissão sobre mortos e desaparecidos políticos, Eugênia Augusta Gonzaga, disse que falta conscientização sobre o que ocorreu no Brasil.

“Essas marchas silenciosas já acontecem em outros países. O Uruguai, por exemplo, já está na 23ª edição da caminhada silenciosa em memória das vítimas. Eu acho que o Brasil não fez a sua lição de casa.”

Parentes de vítimas regime milit, como Ernesto José de Carvalho, que perdeu o pai Devanir José de Carvalho e a mãe Pedrina José de Carvalho, além de dois tios. “É emocionante e significativo participar desse evento, principalmente no momento em que a gente vive hoje”, afirmou. “Este ano, para nós familiares e para mim é importante estar aqui hoje.”

Mariluce Moura, perdeu o marido Gildo Lacerda, e disse ter sido torturada durante a gravidez. “A gente tem que redobrar a resistência democrática, o clamor por Justiça, verdade e memória. Se a gente já fazia essas movimentações no anos anteriores, faremos agora, mais do que nunca.”